domingo, 24 de abril de 2011

O teatro como ferramenta de liberdade
Como disse Jessica Kaahwa, (...)"para que o teatro prospere, devemos dar um passo firme no futuro, incorporando-o na vida quotidiana" (...)
Ora também, direi, sobretudo, no contexto prisional, a prática teatral constitui uma excelente ferramenta para a conquista da liberdade, e da auto estima perdida.
Há sempre uma nesga de sol.
Recordando Manuel Bandeira
VIRGEM MARIA
O oficial do registo civil, o colector de impostos, o mordomo da Santa Casa e o administrador do cemitério de S. joão Baptista
Cavaram com enxadas
Com pás
Com as unhas
Com os dentes
Cavaram uma cova mais funda que o meu suspiro de renuncia
Depois me botaram lá dentro
E puseram por cima
As tábuas da lei
Mas de lá de dentro do fundo da treva da cova
eu ouvia a vozinha da Virgem Maria
Dizer que fazia sol lá fora
Dizer insistentemente
Que fazia sol lá fora

Uma das ferramentas mais importantes no processo de aprendizagem teatral, é, quanto a mim, a Poesia. A possibilidade que nos dá de observar, criar e recriar os valores semântico e sonora das palavras.
Como disse Manuel António Pina: "dizer Poesia é um modo de escrever Poesia"
Segui-se depois de O REI IMAGINÁRIO de Raul Brandão, a leitura e discussão de O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO do Vinicius de Morais.

Mensagem do DIA MUNDIAL DO TEATRO, 2011

DIA MUNDIAL DO TEATRO 2011


"O TEATRO A SERVIÇO DA HUMANIDADE
por Jessica Atwooki Kaahwa

Este é o momento exacto para uma reflexão sobre o imenso potencial que o Teatro tem para mobilizar as comunidades e criar pontes entre as suas diferenças.
Já, alguma vez, imaginaram que o Teatro pode ser uma ferramenta poderosa para a reconciliação e para a paz mundial?
Enquanto as nações consomem enormes quantidades de dinheiro em missões de paz nas mais diversas áreas de conflitos violentos no mundo, dá-se pouca atenção ao Teatro como alternativa para a mediação e transformação de conflitos. Como podem todos os cidadãos da Terra alcançar a paz universal quando os instrumentos que se deveriam usar para tal são, aparentemente, usados para adquirir poderes externos e repressores?
O Teatro, subtilmente, permeia a alma do Homem dominado pelo medo e desconfiança, alterando a imagem que têm de si mesmos e abrindo um mundo de alternativas para o indivíduo e, por consequência, para a comunidade. Ele pode dar um sentido à realidade de hoje, evitando um futuro incerto.
O Teatro pode intervir de forma simples e directa na política. Ao ser incluído, o Teatro pode conter experiências capazes de transcender conceitos falsos e pré-concebidos.

Além disso, o Teatro é um meio, comprovado, para defender e apresentar ideias que sustentamos colectivamente e que, por elas, teremos de lutar quando são violadas. Na previsão de um futuro de paz, deveremos começar por usar meios pacíficos na procura de nos compreendermos melhor, de nos respeitarmos e de reconhecer as contribuições de cada ser humano no processo do caminho da paz. O Teatro é uma linguagem universal, através da qual podemos usar mensagens de paz e de reconciliação. Com o envolvimento ativo de todos os participantes, o Teatro pode fazer com que muitas consciências reconstruam os seus conceitos pré-estabelecidos e, desta forma, dê ao indivíduo a oportunidade de renascer para fazer escolhas baseadas no conhecimento e nas realidades redescobertas.
Para que o Teatro prospere entre as outras formas de arte, deveremos dar um passo firme no futuro, incorporando-o na vida quotidiana, através da abordagem de questões prementes de conflito e de paz.
Na procura da transformação social e na reforma das comunidades, o Teatro já se manifesta em zonas devastadas pela guerra, entre comunidades que sofrem com a pobreza ou com a doença crónica. Existe um número crescente de casos de sucesso onde o Teatro conseguiu mobilizar públicos para promover a consciencialização no apoio às vítimas de traumas pós-guerra.
Faz sentido existirem plataformas culturais, como o [ITI] Instituto Internacional de Teatro, que visam consolidar a paz e a amizade entre as nações. Conhecendo o poder que o Teatro tem é, então, uma farsa manter o silêncio em tempos como este e deixar que sejam “guardiães” da paz no nosso mundo os que empunham armas e lançam bombas. Como podem os instrumentos de alienação serem, ao mesmo tempo instrumentos de paz e reconciliação?
Exorto-vos, neste Dia Mundial do Teatro, a pensar nesta perspectiva e a divulgar o Teatro, como uma ferramenta universal de diálogo, para a transformação social e para a reforma das comunidades.
Enquanto as Nações Unidas gastam somas colossais em missões de paz com o uso de armas por todo o mundo, o Teatro é uma alternativa espontânea e humana, menos dispendiosa e muito mais potente.
Não será a única forma de conseguir a paz, mas o Teatro, certamente, deverá ser utilizado como uma ferramenta eficaz nas missões de paz."











Jessica Atwooki Kaahwa, é professora dos Departamentos de Música, Dança e Teatro da Universidade de Makerere, em Uganda.
Grande defensora dos direitos humanos, Jessica Kaahwa implacavelmente levanta a voz para a igualdade de género, paz e conflito de comunicação. Ela também tem orquestrado várias iniciativas nacionais e internacionais utilizando o teatro para o desenvolvimento humano e continua a sua pesquisa sobre as múltiplas aplicações de teatro em todas as facetas da sociedade. Kaahwa é adepta do "ensinar fazendo". As suas acções humanitárias também incluem a criação de um centro para crianças órfãs na sua fazenda no Uganda, que lhes permita recuperar os sentimentos de auto-estima e segurança.

Auto estima

Depois de algumas, e breves, considerações de carácter geral, importa referir o factor comum a todos os alunos/reclusos: ausência de auto estima.
A expressão «Auto Estima» ouve-se com frequência nos mais diferentes contextos, apontando, no entanto, sempre para o mesmo sentido. Ausência de algo importante na vida de cada um.

Como disse Nathaniel Braden (1930 psicoterapeuta canadiano, cuja obra trata os temas de auto-ajuda, auto-confiança e o que esta determina na saúde mental do indivíduo), a auto-estima assenta, designadamente em seis pilares:
. Atitudes de viver conscientemente
. Auto-aceitação
. Responsabilidade
. Afirmação
. Intencionalidade e
. Integração pessoal».
Ou seja, a base da auto estima assenta na confiança nas nossas capacidades para pensar e enfrentar os desafios; confiança no direito de cada um ao seu quinhão de felicidade; o sentir-se útil e competente, digno, autónomo e qualificado para expressar e satisfazer as suas necessidades e desfrutar as realizações por mais humildes que sejam, e pode definir-se como a opinião que cada um tem acerca de si (auto-conceito), ao qual se junta o valor ou sentimento que se tem de si mesmo (amor próprio, auto-valorização), somando os demais comportamentos e pensamentos que demonstrem a confiança, segurança e valor que o indivíduo dá a si (auto-confiança), nas relações e interacções com outras pessoas e com o mundo. Assim, não estamos a falar apenas de um sentimento que temos por nós mesmos, mas de pensamentos e comportamentos que temos relacionados com nós mesmos. A ausência de auto estima, manifesta-se, designadamente por: fragilidade perante a crítica; rejeição; humilhação; abandono; .desvalorização e perdas importantes.
Para José António Alcântara, “A auto estima é uma atitude para consigo próprio”
Questão pertinente é saber se, porventura, a auto estima é algo de inato, que se «traz» ou se, por motivos diversos, se adquire. Daqui se pode aferir de alguma base comum entre os reclusos/alunos. O mesmo autor afirma: “não; é adquirida e ocorre como resultado da história de cada pessoa”.
Mas o que é uma prisão, afinal, para além do conceito comum?
É um espaço institucional da justiça moderna, arquitectado de forma a acolher pessoas condenadas pelos tribunais a cumprir tratamentos penitenciários, pessoas a quem foi decretada judicialmente uma medida de privação de liberdade para efeitos preventivos antes de julgamento ou pessoas detidas e retidas às ordens de forças policiais ou militares. E por oposição o que é a liberdade?
Para Jean Paul Sartre (filósofo e escritor francês 1905-1980), “a liberdade é a condição ontológica do ser humano”. Spinozza, (filósofo holandês 1632-1677), por seu lado referiu que: “associada à liberdade, está também a noção de responsabilidade, já que o acto de ser livre implica assumir o conjunto dos nossos actos e saber responder por eles”. Questão pertinente que tem que ver com a integração de um indivíduo numa comunidade ou a sua reintegração quando sai da prisão? Então o que é a socialização: É o processo através do qual um indivíduo se torna membro funcional de uma comunidade, assimilando a cultura que lhe é própria. É um processo contínuo que nunca se dá por terminado, realizando-se através da comunicação, sendo inicialmente pela "imitação" para se tornar mais sociável. O processo de socialização inicia-se, contudo, após o nascimento, e através, primeiramente, da família ou outros agentes próximos, da escola, dos meios de comunicação de massas e dos grupos de referência. A socialização é, portanto, um processo fundamental, não apenas para a integração do indivíduo na sua sociedade, mas também, para a continuidade dos sistemas sociais. É o processo de integração do indivíduo numa sociedade, apropriando comportamentos e atitudes, modelando-os por valores, crenças, normas dessa mesma culturas em que o indivíduo se insere. Tem duas variantes: socialização primária: onde a criança aprende e interioriza a linguagem, as regras básicas da sociedade, a moral e os modelos comportamentais do grupo a que se pertence. A socialização primária tem um valor primordial para o indivíduo e deixa marcas muito profundas em toda a sua vida, já que é aí que se constrói o primeiro mundo do indivíduo e socialização secundária: todo e qualquer processo subsequente que introduz um indivíduo já socializado em novos sectores do mundo objectivo da sua sociedade (na escola, nos grupos de amigos, no trabalho, nas actividades dos países para os quais visita ou emigra etc.), existindo uma aprendizagem das expectativas que a sociedade ou o grupo depositam no indivíduo relativamente ao seu desempenho. A resocialização e reintegração serão a mesma coisa? A reintegração social é definida como qualquer intervenção na sociedade com o objectivo de integrar as vítimas de exclusão social presentes numa comunidade, assentes nos três pilares fundamentais dessa reintegração social, que são: habitação, educação e o emprego (incluindo a formação profissional). Também podem ser utilizadas outras medidas, como o aconselhamento e as actividades de lazer.
Bibliografia:
Alcântara, José antónio - Como Educar a Auto Estima - Lisboa, ed. Plátano, 1998

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Como já referi, é fundamental que os alunos/reclusos/actores, entendam e aceitem que a prática teatral pode, e recordando o comentário do recluso brasileiro, esticar o tamanho do pátio para dimensões muito gandes. A primeira leitura foi de: O REI IMAGINÁRIO, de Raul Brandão, e a importância que o sonho tem num contexto como aquele.
"À saída da cadeia o que muda é o tamanho do pátio"
Palavras de um recluso de uma das maiores cadeias do Brasil, sobre as dificuldade de reinserção